Agora
-
-
Unesp FM ao vivo

Notícias » Tudo isto é Fado

Programa 3: Amália Rodrigues I - Letras

publicado em 12/12/2018

Acima, a chamada para o Programa 3.

 

Pesquisa: Maria Júlia Franco de Souza e Beatriz Macedo Souza

 

1) Tudo isto é Fado – Amália Rodrigues

              Autores: Fernando Carvalho / Aníbal Nazaré

 

Perguntaste-me outro dia, se eu sabia o que era o fado 

Eu disse que não sabia, tu ficaste admirado 

Sem saber o que dizia eu menti naquela hora 

Disse-te que não sabia, mas vou-te dizer agora 

 

Almas vencidas, noites perdidas, sombras bizarras 

Na Mouraria, canta um rufia, choram guitarras 

Amor ciúme, cinzas e lume, dor e pecado

Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado 

 

Se queres ser o meu senhor e teres-me sempre a teu lado 

Não me fales só de amor, fala-me também do fado 

A canção que é o meu castigo só nasceu pra me perder 

O fado é tudo o que eu digo mas o que eu não sei dizer

 

2) Ai, Mouraria – Amália Rodrigues

         Autores: Frederico Valério / Amadeu do Vale

 

Ai, Mouraria, da velha Rua da Palma

Onde eu um dia deixei presa a minha alma

Por ter passado mesmo a meu lado certo fadista

De cor morena, boca pequena e olhar trocista

 

Ai, Mouraria, do homem do meu encanto

Que me mentia, mas que eu adorava tanto

Amor que o vento como um lamento levou consigo

Mais que inda agora, e a toda a hora, trago comigo

 

Ai, Mouraria, dos rouxinóis nos beirais

Dos vestidos cor-de-rosa, dos pregões tradicionais

Ai, mouraria, das procissões a passar

Da Severa, em voz saudosa, na guitarra a soluçar

 

3) Barco Negro – Amália Rodrigues

               Autores: Caco Velho & Piratini / David Mourão Ferreira

 

De manhã, que medo, que me achasses feia!

Acordei, tremendo, deitada na areia

Mas logo os teus olhos disseram que não,

E o sol penetrou no meu coração

 

Vi depois, numa rocha, uma cruz,

E o teu barco negro dançava na luz

Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas

Dizem as velhas da praia, que não voltas:

São loucas! São loucas!

 

Eu sei, meu amor, que nem chegaste a partir,

Pois tudo, em meu redor, me diz que estás sempre comigo

 

No vento que lança areia nos vidros;

Na água que canta, no fogo mortiço;

No calor do leito, nos bancos vazios;

Dentro do meu peito, estás sempre comigo

 

Mãe Preta – Caco Velho e Piratini

Pele encarquilhada, carapinha branca

Gândola de renda caindo na anca

Embalando o berço do filho do sinhô

Que há pouco tempo a sinhá ganhou

 

Era assim que mãe preta fazia

Criava todo branco com muita alegria

Porém lá na senzala o seu pretinho apanhava

Mãe preta mais uma lágrima enxugava

 

Mãe preta, mãe preta, Mãe preta, mãe preta

 

Enquanto a chibata batia em seu amor

Mãe preta embalava o filho branco do sinhô

 

4) Foi Deus – Amália Rodrigues

              Autor: Alberto Janes

 

Não sei, não sabe ninguém, por que canto o fado

Neste tom magoado de dor e de pranto

E neste tormento todo o sofrimento

Eu sinto que a alma cá dentro se acalma nos versos que canto

 

Foi deus que deu luz aos olhos

Perfumou as rosas deu oiro ao sol e prata ao luar

Foi deus que me pôs no peito um rosário de penas

Que vou desfiando e choro a cantar

 

E pôs as estrelas no céu e fez o espaço sem fim

Deu o luto às andorinhas... Ai, e deu-me esta voz a mim

 

Se canto não sei o que canto

Misto de ventura, saudade, ternura e talvez amor

Mas sei que cantando sinto o mesmo quando se tem um desgosto

E o pranto no rosto nos deixa melhor

 

Foi deus que deu voz ao vento

Luz ao firmamento e deu o azul às ondas do mar

Foi deus que me pôs no peito um rosário de penas

Que vou desfiando e choro a cantar

 

Fez poeta o rouxinol, pôs no campo o alecrim

Deu as flores à primavera... Ai, e deu-me esta voz a mim.

 

5) Lisboa antiga – Amália Rodrigues

              Autores: José Galhardo / Amadeu do Vale / Raul Portela

 

Lisboa, velha cidade,

Cheia de encanto e beleza

Sempre a sorrir tão formosa,

E no vestir sempre airosa

O branco véu da saudade

Cobre o teu rosto linda princesa

 

Olhai, senhores, esta Lisboa de outras eras,

Dos cinco réis das esperas e das toiradas reais

Das festas, das seculares procissões,

Dos populares pregões matinais que já não voltam mais

 

Lisboa de oiro e de prata

Outra mais linda não vejo

Eternamente a bailar

E a cantar de contente

O teu semblante se retrata

No azul cristalino do Tejo

 

Olhai, senhores, esta Lisboa de outras eras,

Dos cinco réis, das esperas e das toiradas reais

Das festas, das seculares procissões,

Dos populares pregões matinais que já não voltam mais

 

6) Lisboa não seja francesa – Amália Rodrigues

                Autores: José Galhardo / Raul Ferrão

 

Não namores os franceses

Menina, Lisboa

Portugal é meigo às vezes

Mas certas coisas não perdoa

Vê-te bem no espelho

Desse honrado velho

O seu belo exemplo atrai, vai

Segue este leal conselho

Não dês desgostos ao teu pai

 

Lisboa não sejas francesa

Com toda a certeza

Não vais ser feliz

Lisboa, que ideia daninha

Vaidosa, alfacinha,

Casar com Paris

Lisboa, tens cá namorados

Que dizem, coitados,

Com alma na voz

Lisboa, não sejas francesa

Tu és portuguesa

Tu és só pra nós

 

Tens orgulho às lindas fardas

Menina, Lisboa,

Vê lá bem pra quem te guardas

Donzela sem recato, enjoa

Tens aí tenentes,

Bravos e valentes,

Nados e criados cá, vá

Tenha modos mais decentes

Menina caprichosa e má

 

Lisboa não sejas francesa...

 

7) Cheira a Lisboa – Amália Rodrigues

             Autores: César de Oliveira / Carlos Dias

 

Lisboa já tem sol, mas cheira a Lua

Quando nasce a madrugada sorrateira

E o primeiro eléctrico da rua

Faz coro com as chinelas na Ribeira

 

Se chove, cheira a terra prometida

Procissão tem o cheiro a rosmaninho

Na tasca da viela mais escondida

Cheira a iscas com elas e a vinho

 

Um cravo numa água furtada

Cheira bem, cheira a Lisboa

Uma rosa a florir na tapada

Cheira bem, cheira a Lisboa

 

A fragata que se ergue na proa

A varina que teima em passar

Cheira bem porque são de Lisboa

Lisboa tem cheiro de flores e de mar

 

Lisboa cheira aos cafés do Rossio

E o fado cheira sempre a solidão

Cheira a castanha assada se está frio

Cheira a fruta madura quando é Verão

 

Nos lábios há o cheiro de um sorriso

Manjerico tem um cheiro de cantigas

E os rapazes perdem o juízo

Quando lhes dá o cheiro a raparigas

 

Refrão

 

8) Valentim – Amália Rodrigues

Autores: Cancioneiro Popular

 

Adeus casa de meu pai, adeus largo do quinteiro

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Adeus mocidade nova, adeus tempo de solteiro

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

No tempo das desfolhadas, lá na aldeia era um regalo

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Era o tempo em que eu chegava a casa ao cantar do galo

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Adeus casa de meu pai, adeus quarto da palhada

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Era a cama onde eu dormia, ao chegar de madrugada

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Adeus pau de marmeleiro, se ele falasse dizia

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

As pancadas que me deu, quando eu chegava ao ser dia

Quero o Valentim Olaró laró. Quero o Valentim Olaró meu bem

 

Adeus também ao meu pai, adeus vida de solteiro

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

Agora é que eu reconheço o valor do marmeleiro

Quero o Valentim, olaró laró. Quero o Valentim, olaró meu bem

 

9) Fado Malhoa – Amália Rodrigues

Autores: José Galhardo / Frederico Valério

 

Alguém que Deus já lá tem, pintor consagrado

Que foi bem grande e nos dói já ser do passado

Pintou numa tela com arte e com vida

A trova mais bela da terra mais querida

 

Subiu a um quarto que viu à luz do petróleo

E fez o mais português dos quadros a óleo

Um Zé de Samarra, com a amante a seu lado

Com os dedos agarra, percorre a guitarra

E ali vê-se o fado

 

Faz rir a ideia de ouvir com os olhos, senhores

Fará, mas não pra quem já o viu mas em cores

Há vozes da Alfama naquela pintura

E a banza derrama canções de amargura

 

Dali vos digo que ouvi a voz que se esmera

Boçal dum Faia banal, cantando a Severa

Aquilo é bairrista, aquilo é Lisboa

Boêmia e fadista, aquilo é de artista

Aquilo é Malhoa

 

Aquilo é bairrista, aquilo é Lisboa

Boêmia e fadista, aquilo é de artista

Aquilo é Malhoa

 

10) Fado do ciúme – Amália Rodrigues  

             Autores: Amadeu do Vale / Frederico Valério

 

Se não esqueceste o amor que me dedicaste

E o que escreveste nas cartas que me mandaste

Esquece o passado e volta para meu lado

Porque já estás perdoado de tudo que me chamaste

 

Volta meu querido, mas volta como disseste

Arrependido de tudo o que me fizeste

Haja o que houver, já basta pra teu castigo

Essa mulher que andava agora contigo

 

Se é contrafeito, não voltes, toma cautela

Porque eu aceito que vivas antes com ela

Pois podes crer, que antes prefiro morrer

Do que contigo viver sabendo que gostas dela

 

Só o que eu peço, é uma recordação

Se é que mereço um pouco de compaixão

Deixa ficar o teu retrato comigo

Pra eu julgar que ainda vivo contigo

 

11) Cansaço – Amália Rodrigues

              Autores: Luís Macedo / Joaquim Campos

 

Por trás do espelho quem está

De olhos fixados nos meus?

Alguém que passou por cá

E seguiu ao Deus dará

Deixando os olhos nos meus

 

Quem dorme na minha cama

E tenta sonhar meus sonhos?

Alguém morreu nesta cama

E lá de longe me chama

Misturado nos meus sonhos

 

Tudo o que faço ou não faço

Outros fizeram assim

Daí este meu cansaço

De sentir que quanto faço

Não é feito só por mim

 

12) Lágrima – Amália Rodrigues

              Autores: Amália Rodrigues / Carlos Gonçalves

 

Cheia de penas, cheia de penas me deito

E com mais penas, com mais penas me levanto

No meu peito, já me ficou no meu peito

Este jeito, o jeito de te querer tanto

 

Desespero, tenho por meu desespero

Dentro de mim, dentro de mim o castigo

Não te quero, eu digo que não te quero

E de noite, de noite sonho contigo

 

Se considero que um dia hei-de morrer

No desespero que tenho de te não ver

Estendo o meu xaile, estende o meu xaile no chão

Estendo o meu xaile e deixo-me adormecer

 

Se eu soubesse, se eu soubesse que morrendo

Tu me havias, tu me havias de chorar

Por uma lágrima, por uma lágrima tua

Que alegria me deixaria matar

 

Por uma lágrima, por uma lágrima tua

Que alegria me deixaria matar

 

13) Amália – Amália Rodrigues

            Autores: Frederico Valério / José Galhardo

 

Amália, quis Deus que fosse o meu nome

Amália, acho-lhe um jeito engraçado

Bem nosso e popular quando oiço alguém gritar

“- Amália, canta-me o fado”

 

Amália, esta palavra ensinou-me

Amália, tu tens na vida que amar

São ordens do Senhor, Amália sem amor

Não liga, tens de gostar

E como até morrer amar é padecer

Amália chora a cantar!

 

Amália, disse-me alguém com ternura

Amália, da mais bonita maneira

E eu, toda coração, julguei ouvir então

Amália pela vez primeira

 

Amália, andas agora à procura

Amália, daquele amor, mas sem fé

Alguém já mo tirou, alguém o encontrou

Na rua com a outra ao pé

E a quem lhe fala em mim, já só responde assim

“- Amália? Não sei quem é!”

 

14) Fado Português – Amália Rodrigues

             Autores: Alain Oulman / José Régio

 

O Fado nasceu um dia

Quando o vento mal bulia

E o céu o mar prolongava

Na amurada dum veleiro

No peito dum marinheiro

Que, estando triste, cantava

Que, estando triste, cantava

 

Ai, que lindeza tamanha

Meu chão, meu monte, meu vale

De folhas, flores, frutos de oiro

Vê se vês terras de Espanha

Areias de Portugal

Olhar ceguinho de choro

 

Na boca dum marinheiro

Do frágil barco veleiro

Morrendo a canção magoada

Diz o pungir dos desejos

Do lábio a queimar de beijos

Que beija o ar, e mais nada

Que beija o ar, e mais nada

 

Mãe, adeus, adeus, Maria

Guarda bem no teu sentido

Que aqui te faço uma jura

Que ou te levo à sacristia

Ou foi Deus que foi servido

Dar-me no mar sepultura

 

Ora eis que embora outro dia

Quando o vento nem bulia

E o céu o mar prolongava

À proa de outro veleiro

Velava outro marinheiro

Que, estando triste, cantava

Que, estando triste, cantava