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Programa 1: Fado - Introdução I - Letras

publicado em 04/12/2018

Acima, a chamada para o Programa 1.

 

Pesquisa: Maria Júlia Franco de Souza e Beatriz Macedo Souza

 

1) Maria Severa – Argentina Santos

             Autores: José Galhardo / Raul Ferrão

 

Num beco da Mouraria, onde a alegria e o sol não vêm

Morreu Maria Severa, sabem quem era

Talvez ninguém

 

Uma voz sentida e quente que hoje à terra disse adeus

Voz saudosa, voz ausente, mas que vive eternamente

Dentro em nós e junto a Deus

Além nos céus

 

Bem longe onde o luar no azul tem mais luz

Eu vejo-a rezar aos pés de uma cruz

Guitarras trinai viradas pro céu

Fadistas chorai porque ela morreu

 

Caiu a noite na viela quando o olhar dela

Deixou de olhar. Partiu pra sempre, vencida

Deixando a vida que a fez chorar

 

Deixa um filho idolatrado que outro afeto igual não tem

Chama-se ele o triste fado. Que vai ser desse enjeitado

Se perdeu o maior bem, o amor de mãe

 

Bem longe onde o luar...

 

2) Antes e Depois – Alfredo Marceneiro & Fernando Farinha

            Autores: Fernando Farinha / João da Mata

 

Minha guitarra é vaidosa, mas vaidosa com encanto

Sente-se toda orgulhosa, todas as vezes que canto

 

Alfredo quando tu cantas, cantas com tanta saudade

Eu sinto que tu encantas toda a minha mocidade

 

Dizem que o fado desgraça o fado de muita gente

Mentira, o fado não passa dum fado que qualquer sente

 

O fado é a voz do povo que com o povo nasceu

Tu és antigo e eu sou novo será meu o que foi teu

 

Entre fadistas de lei com meu concurso não falto

Tenho orgulho em ser da grei dos faias do Bairro Alto

 

Apesar de muito novo quando canto uma cantiga

Faço recordar ao povo a fadistagem antiga

 

A minha pobre garganta já não tem a voz de outrora

Mas quando canta, ainda canta ao pé das vozes de agora

 

Quem sabe meu pioneiro se nesta história não fica

O Alfredo Marceneiro junto ao “Miúdo da Bica”

 

3) Fado bailado – Alfredo Marceneiro

                        Autores: Henrique Rego / Alfredo Marceneiro

 

À mercê dum vento brando bailam rosas nos vergeis

E as Marias vão bailando enquanto vários Manéis

Nos harmónios vão tocando

 

Tudo baila, tudo dança, nosso destino é bailar

E até mesmo a doce esperança dum lindo amor se alcançar

De bailar nunca se cansa

 

Baila o nome de Jesus em milhões de lábios crentes

Em bailado que seduz e as falenas inocentes

Bailam à roda da luz

 

A folhagem ressequida baila envolvida em poeira

E com a razão perdida há quem leve a vida inteira

A bailar com a própria vida

 

Tudo baila, tudo dança. Nosso destino é bailar

E até mesmo a doce esperança dum lindo amor se alcançar

De bailar nunca se cansa

 

4) Estranha forma da vida – Amália Rodrigues/Lisbon City Rockers

             Autores: Amália Rodrigues / Alfredo Marceneiro

 

Foi por vontade de Deus que eu vivo nesta ansiedade

Que todos os ais são meus, que é toda minha a saudade

Foi por vontade de Deus

 

Que estranha forma de vida tem este meu coração

Vive de vida perdida, quem lhe daria o condão

Que estranha forma de vida

 

Coração independente, coração que não comando

Vive perdido entre a gente teimosamente sangrando

Coração independente

 

Eu não te acompanho mais. Pára, deixa de bater

Se não sabes onde vais por que teimas em correr

Eu não te acompanho mais

 

Se não sabes onde vais por que teimas em correr

Eu não te acompanho mais

 

5) A Casa da Mariquinhas – Alfredo Marceneiro                      

            Autores: Silva Tavares / Alfredo Marceneiro

 

É numa rua bizarra

A casa da mariquinha

Tem na sala uma guitarra

E janelas com tabuinhas

 

Vive com muitas amigas

Aquela de quem vos falo

E não há maior regalo

Que a vida de raparigas

É doida pelas cantigas

Como no campo a cigarra

Canta o fado à guitarra

De comovida até chora

A casa alegre onde mora

É numa rua bizarra

 

Para se tornar notada

Usa coisas esquisitas

Muitas rendas, muitas fitas

Lenços de cor variada.

Pretendida, desejada

Altiva como as rainhas

Ri das muitas, coitadinhas

Que a censuram rudemente

Por verem cheia de gente

A casa da Mariquinhas

       

 

 

 

É de aparência singela

Mas muito mal mobilada

E no fundo não vale nada

O tudo da casa dela

No vão de cada janela

Sobre coluna, uma jarra

Colchas de chita com barra

Quadros de gosto magano

Em vez de ter um piano

Tem na sala uma guitarra

 

Pra guardar o parco espólio

Um cofre forte comprou

E como o gás acabou

Ilumina-se a petróleo.

Limpa as mobílias com óleo

De amêndoa doce e mesquinhas

Passam defronte as vizinhas

Pra ver o que lá se passa

Mas ela tem por pirraça

Janelas com tabuinhas

 

 

 

6) Vou dar de beber à dor – Amália Rodrigues

             Autor: Alberto Janes

 

Foi no Domingo passado que passei

À casa onde vivia a Mariquinhas,

Mas está tudo tão mudado

Que não vi em nenhum lado

As tais janelas que tinham tabuinhas.

 

Do rés-do-chão ao telhado

Não vi nada, nada, nada

Que pudesse recordar-me a Mariquinhas,

E há um vidro pregado e azulado

Onde havia as tabuinhas.

 

Entrei e onde era a sala agora está

À secretária um sujeito que é lingrinhas,

Mas não vi colchas com barra

Nem viola, nem guitarra,

Nem espreitadelas furtivas das vizinhas.

 

O tempo cravou a garra

Na alma daquela casa

Onde às vezes petiscávamos sardinhas

Quando em noites de guitarra e de farra

Estava alegre a Mariquinhas.

      

   Com cortinados de chita às pintinhas

   Perderam de todo a graça

   Porque é hoje uma vidraça

   Com cercadura de lata às voltinhas.

 

   E lá pra dentro quem passa

   Hoje é pra ir aos penhores

   Entregar ao usurário umas coisinhas,

   Pois chega a esta desgraça toda a graça

   Da casa da Mariquinhas.

 

   Pra terem feito da casa o que fizeram

   Melhor fora que a mandassem pras alminhas,

   Pois ser casa de penhores

   O que foi viveiro d'amores

   É ideia que não cabe cá nas minhas

 

   Recordações do calor e das saudades.

   O gosto que eu vou procurar esquecer

   Numas ginginhas,

   Pois dar de beber à dor é o melhor,

   Já dizia a Mariquinhas.

 

7) Mariquinhas – Gisela João

             Autores: Capicua /Alberto Janes

 

Foi numa ruela escura que encontrei

A tal casa do fado “A Mariquinhas”

Que de Alfredo Marceneiro

Veio ao nosso cancioneiro

Como sendo uma casa de meninas

E com o tempo passado

Foi na voz da Dona Amália

Que a casa foi da desgraça às ginjinhas

E que mesmo com um fado renovado

Já não tinha nem sardinhas

 

Depois veio a Hermínia Silva que cantou

O regresso da saudosa Mariquinhas

Mas foi sol de pouca dura

Que mesmo sem ditadura

Hoje em dia até as vacas são lingrinhas

 

Agora veem meus olhos

Que nem amor, nem penhor

Esta casa está mais velha que as vizinhas

As janelas estão tapadas com tijolos

E as paredes estão sozinhas

 

Só um gato solitário no telhado

E uma placa que está cheia de letrinhas

Vende-se, oca e esburacada

Por fora toda riscada

E encostada, na fachada, uma menina

       

 

 

 

 

 

Mas esta não canta o fado

Só sabe fumar cigarro e com o fumo

Quando sopra faz bolinhas

Não sabe quem já morou naquele espaço

Ou quem foi a Mariquinhas

 

E aqui estou eu à porta desgostosa

Vendo a casa que está morta e em ruínas

Por causa destes senhores

Até já nem tem penhores

Porque mais ninguém tem ouro nas voltinhas

 

Mas seu eu fechar os olhos

E imaginar as farras

Ainda se ouve as guitarras e cantigas

Porque a casa é a canção que sei de cor

E vou cantar toda a vida

Porque a casa é a canção que sei de cor

E vou cantar toda a vida!

 

 

8) Meu amor, meu amor (Meu limão de amargura) – Amália Rodrigues/ Gisela João & Camané/ Metrô

             Autores: Ary Dos Santos / Alain Oulman

 

Meu amor meu amor, meu corpo em movimento

Minha voz à procura do seu próprio lamento

 

Meu limão de amargura, meu punhal a escrever

Nós parámos o tempo, não sabemos morrer

E nascemos, nascemos do nosso entristecer

 

Meu amor, meu amor, meu nó de sofrimento

Minha mó de ternura, minha nau de tormento

 

Este mar não tem cura, este céu não tem ar

Nós parámos o vento, não sabemos nadar

E morremos, morremos - devagar, devagar